Pillars of Eternity II: Deadfire
O Jason Schreier é um dos jornalistas mais respeitados no meio da jogos, e publicou um artigo interessante no Kotaku sobre o que as recentes aquisições representam para o Xbox e para a Microsoft. Tem algumas cutucadas no meio do texto: mas são palavras dele, não minhas. Botei umas figurinhas no meio pra não ficar só texto/texto/texto.
Fonte original, em inglês: https://kotaku.com/microsoft-s-new-studio-acquisitions-show-how-much-xbox-1830383030
Foi como uma leve surpresa o momento em que a Microsoft anunciou que estava comprando não um, mas dois estúdios médios com foco em jogos de RPG. Mas, por mais estranho que isso possa ser na superfície, o acordo faz total sentido para as três partes.
Ao final de um evento sem grandes surpresas na Cidade do México no sábado, o head da Microsoft Studios, Matt Booty, anunciou que a sua companhia pretende adquirir a Obsidian (Fallout New Vegas) e a Inxile (Wasteland). A primeira, nós já sabíamos – o Kotaku anunciou o furo mês passado – mas a segunda pareceu estranha. Obsidian e Inxile compartilham diversos traços em comum. As duas são especialistas em RPGs antigos de PC, ambas descendem da linhagem da Interplay (Fallout) e da Black Isle (Baldur’s Gate), e ambas operam naquela terra de ninguém entre jogos independentes e AAA, fazendo aqueles jogos de orçamento médio que muitas publishers abandonaram. Por que a Microsoft compraria as duas?
Para a Obsidian e a Inxile, o negócio era simples: ambos os estúdios enfrentaram problemas financeiros ao longo dos anos, e o financiamento coletivo não era suficiente para apoiar os jogos ambiciosos que eles queriam fazer. Pillars of Eternity 2, que saiu no primeiro semestre, foi um fracasso comercial – e um excelente jogo que ficou ofuscado pelo transcendente Divinity Original Sin 2. O recente The Bard’s Tale IV teve reviews medíocres. Pulando de financiamento coletivo em financiamento coletivo parecia insustentável, e agora, Obsidian e Inxile tem a segurança financeira por muitos anos (ou, pelo menos, até a próxima vez que o chefe de Xbox mudar).
Wasteland 3
Não é tão simples perceber o porquê da Microsoft querer duas companhias parecidas. Obviamente, a line-up de jogos first-party foi um pouco anêmica nos últimos dois anos, especialmente comparado ao seu principal competidor, Sony, que parece colocar na rua um competidor de Game of the Year atrás do outro. Mas a Obsidian e a Inxile são estúdios menores – nenhum é tã grande quanto uma Sony Santa Monica (God of War) ou Guerrilla Games (Horizon: Zero Dawn), e nenhuma tentou uma vez competir na corrida de fidelidade gráfica. Como elas se encaixam na estratégia de longo prazo da Microsoft?
A verdade é, e o time de Xbox tem sinalizado isso já há algum tempo, e como pescamos em nossas próprias conversas com pessoas dentro e fora da empresa, que a Microsoft não está mais interessada em competir diretamente com a Sony. É uma batalha perdida desde que os executivos começaram a delinear os planos estranhos do Xbox One, em 2013. O PS4 superou o Xbox One de maneira tão retumbante que a Microsoft simplesmente parou de oferecer números de vendas.
Ao invés de lamber as feridas e lutar com a Sony na próxima geração, sob o comando de Phil Spencer, a divisão Xbox optou por uma abordagem drasticamente diferente. O que a Microsoft quer hoje é ter estúdios que ajudem a impulsionar as assinaturas de seu impressionante Xbox Game Pass, sua futura plataforma de streaming, e suas contínuas tentativas no mercado de PC. Desenvolver grandes exclusivos de Xbox não é mais uma prioridade pra Microsoft, e de fato, a companhia decidiu em 2016 que todos os seus jogos chegariam ao Xbox e ao PC. Em breve, o Game Pass também estará disponível no PC, e não será chocante ver a Microsoft abraçando o Steam – ou reformulando a Windows Store – à medida que tenta alcançar milhões de jogadores que jogam em computadores.
Matt Booty, Head da Microsoft Studios
Então, com isto em mente, por que a Microsoft não iria querer ter duas respeitadas desenvolvedoras de jogos pra PC? Spencer e a equipe devem estar salivando por apresentar bundles de RPG para os assinantes do Game Pass. Tanto a Obsidian quanto a Inxile possuem desenvolvedores talentosos mas minados por falta de recursos, e as duas fazem jogos com um apelo bem específico, para audiências mais hardcore, o que faz total sentido na estratégia de longo prazo da Microsoft.
Isso não quer dizer que tudo vai funcionar perfeitamente. Qualquer desenvolvedor que trabalhou com as versões anteriores da Microsoft tem histórias sobre o quão frustrante a estrutura de gestão da empresa pode ser. Até a Obsidian tem uma história assim, uma que tornou essa aquisição até mais chocante pra muita gente.
Em 2011, a Obsidian assinou um acordo para criar um jogo chamado Stormlands, planejado para ser um título de lançamento do Xbox One. Era um RPG ambicioso que a Microsoft cancelou por inúmeras razões – todos os envolvidos admitem que ambas as companhias dividem a culpa – mas foi um que sofreu muito com a natureza inchada da Microsoft à época. O CEO da Obsidian, Feargus Urquhart, me disse em uma entrevista há alguns anos que a Microsoft tinha uma equipe de diretores e produtores atribuídas em Stormlands, incluindo um produtor executivo que trabalhou com o estúdio durante as fases iniciais de apresentação e aprovação do desenvolvimento.
Como originalmente planejado, Stormlands teria um modo cooperativo multiplayer, diz Urquhart. Então, esse executivo sugeriu algo diferente. Relembra Urquhart: “uns três meses no processo de apresentação, ele disse algo como ‘eu acho que nós temos que fazer esse jogo ser incrível. O que vocês acham de acabar com o multiplayer e focar em ser um bom jogo de RPG?’”
Stormlands
Então, como era comum na Microsoft da época, alguma coisa mudou. “Umas duas semanas depois disso, ele foi realocado e um produtor diferente ficou no seu lugar. Ele tinha uma visão diferente, e esta visão era dobrar o investimento em multiplayer.”
Stormlands foi, em diversas formas, a epítome do jeito antigo da Microsoft fazer as coisas. A Microsoft insistiu em uma longa lista de complementos, incluindo Kinect, computação na nuvem e suporte ao SmartGlass, e o projeto ficou tão abarrotado que nenhuma das companhias podia salvá-lo. Hoje, sob uma nova liderança e estrutura, a divisão Xbox é muito diferente, e é fácil vislumbrar um mundo onde Spencer e companhia permitam que Obsidian e Inxile prosperem. Se isto acontecer, a boa notícia para as pessoas que só gostam de jogar videogame é que dois estúdios de médio porte talentosíssimos que talvez não se encaixassem mais na indústria de hoje tem uma chance de conseguir o seu sucesso a longo prazo, graças a ambição cada vez maior da Microsoft.
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É bem perceptível essa mudança de rumo que a Microsoft abraçou na segunda metade desta geração em relação ao Xbox. Pra muita gente, vai parecer que foi só um jeito de escapar das comparações diretas, e, apesar de concordar que aparentava ser realmente isso há alguns anos, hoje já dá pra ver um quadro muito mais claro do porquê isso foi feito e pra onde a Microsoft deseja ir.